quinta-feira, 22 de março de 2012


O PRIMEIRO MANDAMENTO E A RELIGIÃO


“Adorarás o Senhor teu Deus e só a ele servirás” (Mateus 4,10; cfr. Deuteronômio 6,13;) foi a resposta que Jesus deu ao Diabo que o tentava, dizendo: “Dar-te-ei tudo isto (os reinos do mundo), se, prostrando-te diante de mim, me adorares” (Mateus 4,9).


Só há um Deus e só a Ele devemos adorar. É pela religião que traduzimos em atos nosso culto ao único Deus. Estes são os principais:


• adoração: consiste em reconhecer a Deus – por meio de pensamentos, afetos e outras atitudes interiores e exteriores – como nosso Criador, Pai e Salvador, Senhor de tudo o que existe, Amor infinito e misericordioso.


• oração: exprime a Deus nosso louvor, nossa ação de graças, nossos pedidos de ajuda e nosso arrependimento pelos pecados;


• sacrifício: tem como finalidade expressar a Deus nosso louvor, nossa submissão, nossa humildade, nosso pedido de perdão. O sacrifício perfeito foi o do amor de Cristo na cruz; nossos sacrifícios se unem ao dele para adorar ao Pai;


• promessas e votos: são formas diversificadas de nos comprometermos com Deus a realizar esta ou aquela obra de bem.


A religião deve ter também dimensões públicas, pois, além de pertencermos a Deus enquanto pessoas, nós Lhe pertencemos também enquanto comunidade, dado que o ser humano é um ser social.


Aqui convém responder à seguinte questão: por que há tantas religiões diferentes? Serão todas iguais? Tanto faz uma como a outra? Não! As religiões variam porque nem todos têm o mesmo conceito de Deus e do ser humano: variando esse conceito, varia também a religião praticada.


A verdadeira religião foi revelada pelo próprio Deus ao povo de Israel e, em seguida, aperfeiçoada por Jesus. Daqui resulta que todo o seguidor de Cristo tem o dever de ser missionário, isto é, de anunciar o verdadeiro Deus, seu Filho Jesus Cristo e sua Igreja, que continua no mundo a missão de evangelizar.


No trabalho missionário, é preciso sempre respeitar a liberdade de consciência das pessoas. Embora nem todas as religiões sejam “verdadeiras”, ocorre que muitas pessoas, sem culpa própria, ignoram a Palavra de Deus e, portanto, vivem serenamente sua religião, de boa fé.


Todavia, a liberdade religiosa não pode significar desinteresse pelo assunto religioso, pela existência ou não de Deus; particularmente se isso ocorresse porque a pessoa quer “ficar à vontade” e, assim, poder se entregar a quaisquer atitudes sem remorsos de consciência: isso não seria liberdade, seria libertinagem. Pelo contrário, todos têm a obrigação grave de formar a própria consciência, informando-se, na medida do seu possível, a respeito da verdade de Deus, de Cristo e de sua Igreja.


Voltando à questão de um único Deus: se é assim, logicamente não existem outros deuses! Disse Deus a seu povo: “Não terás outros deuses além de mim” (Êxodo 20,3; cf. Deuteronômio 5, 7). Apesar disso, muitos membros do povo escolhido praticaram a idolatria, como hoje também muitos a praticam. A única diferença é que os falsos deuses modernos têm outros nomes: orgulho, poder, egoísmo, sexo, dinheiro...


Adorar outros deuses chama-se “idolatria”. Ela pode ocorrer de diversas formas. É sempre pecado e, portanto, ofensa a Deus. Estas são algumas delas:

• idolatria em sentido estrito: consiste em divinizar o que não é Deus, negar o senhorio exclusivo de Deus sobre tudo o que existe e, por consequência, prestar culto a alguma criatura fabricada pelo ser humano ou já existente; também é idolatria dar importância absoluta a certas coisas ou atitudes, como o poder, o dinheiro, a raça, o Estado;


• superstição: é o desvio do sentimento religioso e das práticas com que ele se exprime; por exemplo, atribuir forças mágicas a certos ritos e orações por crer que dispõem de eficácia independentemente das disposições interiores;


• adivinhação e pela magia ou feitiçaria: a adivinhação consiste em recorrer ao diabo, aos mortos ou a outras criaturas a fim de descobrir o futuro; a magia ou feitiçaria pretende dominar os poderes sobrenaturais para colocá-los ao próprio serviço e conseguir objetivos divinos. Essas práticas revelam falta de confiança em Deus, que disse a seu povo Israel: “Não haja em teu meio... quem consulte adivinhos, ou observe sonhos ou agouros, nem quem use feitiçaria; nem quem recorra à magia, consulte oráculos, interrogue espíritos ou evoque mortos. Pois o Senhor abomina quem se entrega a tais práticas” (Deuteronômio 18,10-12). Estas palavras são também a condenação para certas práticas do espiritismo.


• irreligião: é a falta total de respeito para com Deus, pondo-o à prova a fim de conferir seu poder ou sua bondade ou qualquer um de seus atributos: “Não tenteis o Senhor vosso Deus (Deuteronômio 6,16);


• sacrilégio: consiste em profanar ou tratar indignamente tudo o que se refere ao culto de Deus, sejam pessoas, coisas ou lugares consagrados, sejam ações litúrgicas, sobretudo sacramentos;



• simonia: consiste em vender ou comprar coisas e ações sagradas ou realidades espirituais;


• ateísmo: é a atitude de quem nega a Deus ou vive como se ele não existisse e valoriza unicamente as coisas materiais fazendo do ser humano fim em si mesmo;


• agnosticismo: afirma a impossibilidade de provar a existência de Deus ou pensar que, mesmo se ele existir, não pode se revelar a nós e nós nada podemos dizer sobre ele.


Uma questão final: falando em ídolos, como fica a questão das imagens? Deus disse ao povo escolhido: “Guardai-vos bem de corromper-vos, fazendo figuras de ídolos de qualquer tipo, imagens de homem ou de mulher, imagens de animais... Nem levanteis os olhos até o céu para ver o sol, a lua, as estrelas com todo o exército do céu, deixando-vos seduzir, adorando-os e prestando-lhes culto” (Deuteronômio 4,16-19).

Com essa ordem, Deus procura evitar que seu povo Israel caia nessa tentação. Portanto, não se trata de proibir fazer imagens em si; a proibição condena fazer imagens com a finalidade de adorá-las como ídolos. Por incrível que pareça, o mesmo Deus mandou fazer algumas imagens! Por exemplo: a serpente de bronze, a Arca da Aliança, os querubins que estavam sobre ela... O próprio Jesus aludiu à serpente de bronze: ao contrário de condená-la, tornou-a símbolo de sua própria elevação sobre a cruz: “Como Moisés levantou a serpente no deserto, assim também será levantado o Filho do Homem, a fim de que todo aquele que nele crer tenha a vida eterna” (João 15,14).



A Igreja sempre aprovou que se fizessem imagens, nunca, porém, a fim de serem adoradas; venerá-las não é nenhum erro ou pecado. As imagens são como símbolos ou “fotografias” que nos ajudam a trazer à memória esta ou aquela pessoa santa que queremos lembrar ou a quem queremos recorrer. Pecado seria adorá-las em sentido estrito, atitude que só a Deus é devida.


NB - Este texto foi aqui reproduzibo com a devida autorização de seu Autor:
         Dom Hilário Moser, SDB
         Biapo Emerito de Tubarão, SC



O TERCEIRO MANDAMENTO E A EUCARISTIA DOMINICAL


Qual será a melhor forma de prestar culto a Deus nos domingos e dias santos? É a celebração da Eucaristia a melhor forma de culto a Deus em qualquer tempo, mais ainda quando celebrada com a comunidade cristã reunida no Dia do Senhor ou em algum dia santo. Não há ato de culto mais sublime do que a Eucaristia: ela torna presente no tempo e no espaço o único sacrifício de Jesus na cruz, sua morte e ressurreição, sacrifício que salvou o mundo; além disso, participamos da Eucaristia comungando o corpo e o sangue do Senhor. Nada pode adorar e louvar mais a Deus, agradecer-lhe os imensos benefícios, implorar o perdão dos pecados e pedir a ajuda de que necessitamos, do que a Eucaristia ou Santa Missa. Ela é o coração do domingo.

Tem grande importância participar da comunidade cristã no Dia do Senhor. Aliás, a Eucaristia é por si mesma uma celebração de cunho comunitário. É este o sentido da comunhão eucarística: comunga-se o Corpo e o Sangue de Jesus a fim de ter forças para, ao longo da semana, comungar na caridade com todos os irmãos e irmãs que, no Dia do Senhor, se reúnem em torno do próprio Jesus. Participar da Missa em comunidade significa que temos consciência de pertencer a Cristo e de querermos ser fiéis a ele e à sua Igreja.

Onde não for possível haver a celebração eucarística dominical por falta de ministro sagrado, a Igreja recomenda que participemos da Liturgia da Palavra (culto) na própria comunidade, de acordo com as orientações do bispo diocesano. Não havendo culto, cada um, sozinho, em família ou em grupos de famílias, se dedique à leitura e meditação da Palavra de Deus e à oração. Todavia, podendo participar da Eucaristia, mesmo tendo que locomover-se com algum sacrifício, sempre deve prevalecer a participação na Eucaristia dominical.

A respeito da suspensão do trabalho aos domingos, convém considerar quanto afirma o Catecismo da Igreja Católica: “A vida humana é ritmada pelo trabalho e pelo repouso. A instituição do Dia do Senhor contribui para que todos desfrutem do tempo de repouso e de lazer suficiente que lhes permita cultivar sua vida familiar, cultural, social e religiosa” (n. 2181). Isso supõe evitar os trabalhos ou atividades que impedem fazer do domingo um dia de culto, dia de alegria, de prática do bem (obras de misericórdia) e de descanso para o corpo e o espírito. Evidentemente, há exceções: necessidades familiares ou uma grande utilidade social são motivos legítimos para dispensa do preceito do repouso dominical, mas com o cuidado para que isso não se transforme em hábito injustificado, com prejuízo para a religião, a família e às vezes até para a saúde.

Além do descanso, há outras formas de preencher o domingo. A pobreza e a miséria muitas vezes não permitem descanso ou lazer, embora todos tenham as mesmas necessidades e os mesmos direitos. As obras de misericórdia para com os mais necessitados, o cuidado dos doentes, idosos e crianças... são ótimas ocasiões para a piedade cristã se exercitar aos domingos. Também a família e os parentes merecem atenção nesse dia. O domingo, igualmente, é também tempo de reflexão, silêncio, cultura, oração, enfim, de tudo o que ajuda a crescer na vida interior. Afinal, acima de tudo, somos filhos e filhas de Deus.

Por isso tudo, aos domingos e dias santos, evite-se impor trabalhos a outros. Se as necessidades sociais o exigirem, será preciso encontrar modos de proporcionar tempo para o lazer em outros momentos. É obrigação dos poderes públicos respeitar a consciência dos fiéis e dar-lhes oportunidades de repouso dominical e de prática religiosa no Dia do Senhor. Idêntica obrigação têm os patrões para com seus empregados.

Se algum católico ficar totalmente impedido de celebrar o Dia do Senhor, procure de alguma maneira elevar seu coração a Deus, em união com todos os que nesse dia participam da Eucaristia, adoram e louvam ao Senhor. Finalmente, o domingo exige também que se evite a falta de moderação nas diversões e as violências causadas por elas.



NB - O presente texo foi aqui reprodutzido com a devida autorização de seu Autor:
         Dom Hilário Moser, SDB
         Bispo Emérito de Tubarão, SC

TERCEIRO MANDAMENTO: GUARDAR OS DOMINGOS E FESTAS DE GUARDA


Faz parte da virtude da religião respeitar o Dia do Senhor, pois também o tempo pertence a Deus. No Antigo Testamento o dia dedicado a Deus era o sábado. “Lembra-te de santificar o dia do sábado. Trabalharás durante seis dias e farás todos os trabalhos, mas o sétimo dia é sábado, descanso dedicado ao Senhor teu Deus. Não farás trabalho algum” (Êxodo 20,8-10). Portanto, o terceiro mandamento nos pede para dedicar o dia santo ao Senhor e descansar dos trabalhos: o dia santo é para a Deus, o descanso é para o ser humano.

O sábado lembrava ao povo de Israel particularmente três acontecimentos fundamentais:
• a criação do mundo: “O Senhor fez em seis dias o céu e a terra, o mar e tudo o que eles contêm; mas no sétimo dia descansou. Por isso o Senhor abençoou o dia do sábado e o santificou” (Êxodo 20,11);
• a libertação da escravidão do Egito: “Lembra-te de que foste escravo no Egito, mas o Senhor teu Deus te tirou de lá com mão forte e braço estendido. É por isso que o Senhor teu Deus ordena que guardes o sábado” (Deuteronômio 5,15);
• a Aliança: “Os israelitas guardarão o sábado, observando-o por todas as gerações como aliança perpétua” (Êxodo 31,16).

Em relação ao trabalho, o sábado se destina também ao descanso. Essa pausa nos trabalhos “será um sinal perpétuo entre mim e os israelitas. Pois em seis dias o Senhor fez o céu e a terra, e no sétimo parou para respirar” (Êxodo 31,17). Assim, o agir de Deus é modelo do agir humano. “Também o homem deve ‘folgar’ e deixar que os outros, sobretudo os pobres, ‘retomem fôlego’ (cf. Êxodo 23,12). O sábado faz cessar os trabalhos cotidianos e concede uma pausa. É um dia de protesto contra as escravidões do
trabalho e o culto do dinheiro” (Catecismo da Igreja Católica n. 2172).

É interessante e instrutivo observar o comportamento de Jesus quanto ao sábado. Diversas vezes Ele foi acusado de violar a lei do sábado, mas ele, na verdade, nunca o profanou. Com pena dos sofredores, curou doentes, isso sim, ou atendeu a necessidades urgentes das pessoas. “Num dia de sábado, Jesus passou pelas plantações de trigo. Seus discípulos estavam com fome e começaram a arrancar espigas para comer.

Vendo isso, os fariseus disseram-lhe: ‘Olha, os teus discípulos fazem o que não é permitido fazer em dia de sábado!’ Jesus respondeu:... Se tivésseis chegado a compreender o que significa, ‘Eu quero a misericórdia e não sacrifícios’, não condenaríeis inocentes. De fato, o Filho do Homem é Senhor do sábado” (Mateus 12,1-3.7).

Com o Novo Testamento, nós, cristãos, passsamos a dedicar ao Senhor o dia de Domingo, palavra que significa precisamente “do Senhor”. O motivo está no fato de Jesus ter ressuscitado no dia seguinte ao sábado. Esse dia, enquanto primeiro dia da semana, recorda o início da criação do mundo. Mas o domingo pode ser considerado também como oitavo dia da semana e, nesse caso, nos lembra a nova criação inaugurada pela ressurreição de Jesus. Por causa disso, o dia seguinte ao sábado passou a ser, na praxe eclesial, o primeiro dia, o Dia do Senhor. A Igreja sempre entendeu que o domingo, dia em que Cristo ressuscitou, confere sentido pleno ao sábado judaico e anuncia o repouso eterno do homem em Deus.

Conhecemos o modo de celebrar o domingo nos inícios do cristianismo. É dos tempos apostólicos a praxe de os fiéis se reunirem para ouvir a Palavra de Deus e celebrar a Eucaristia. “Eles eram perseverantes em ouvir o ensinamento dos apóstolos, na comunhão fraterna, na fração do pão (este era o nome dado à Eucaristia) e nas orações [...] Perseverantes e bem unidos, frequentavam diariamente o templo, partiam o pão (Eucaristia) pelas casas e tomavam a refeição com alegria e simplicidade de coração. Louvavam a Deus e eram estimados por todo o povo” (Atos dos Apóstolos 2,43.46-47). São famosos também os testemunhos que datam do primeiro século sobre a celebração do Dia do Senhor. À imitação da comunidade de Jerusalém, da qual falam os Atos dos Apóstolos, os cristãos se reuniam nesse dia para ouvir a Palavra de Deus, celebrar a Eucaristia, fomentar a comunhão fraterna e cuidar dos pobres.

Foi assim que, aos poucos, criou-se na Igreja a praxe de celebrar o domingo. Respeitar o domingo como Dia do Senhor e reservá-lo para prestar culto a Deus, este é o grande ato de amor a Deus pedido pelo terceiro mandamento. Por isso, a Igreja determina: “O domingo, dia em que por tradição apostólica se celebra o Mistério Pascal, deve ser guardado em toda a Igreja como dia de festa de preceito por excelência” (Código de Direito Canônico c. 1246,1). É este um dos Mandamentos da Igreja; com essa norma, ela entende ligar gravemente a consciência dos fiéis.

Infelizmente, nos tempos atuais, muitos católicos ignoram, na teoria e na prática, essa norma; violam o domingo sem se sentirem culpados por causa disso. A norma da Igreja existe para estimular a fraqueza humana a consagrar ao Criador um dia por semana e também para compreender que o trabalho (e o dinheiro...) não é tudo na vida.

Ao longo dos séculos, a Igreja estabeleceu também outros dias especiais de culto ao Senhor, os chamados “dias santos de guarda”. Todos eles celebram mistérios da vida de Cristo ou de Nossa Senhora ou mesmo a festa de algum santo. Todavia, conforme a diversidade das situações do mundo, o episcopado local, com o consentimento da Sé Apostólica, pode fundir algumas dessas celebrações com um domingo próximo, ou mesmo não celebrar algum santo. No Brasil, por exemplo, os dias santos ao longo da semana são somente quatro: Natal, Corpus Christi, Santa Mãe de Deus (1º de janeiro) e Imaculada Conceição (8 de dezembro); os demais dias santos que havia até anos atrás passaram a ser celebrados no domingo seguinte à data que lhes era própria. Aqui cabe um pequeno esclarecimento: ao contrário do que muita gente pensa, não são dias santos de guarda a Sexta-Feira Santa, a festa de Nossa Senhora Aparecida (12 de outubro) e o Dia de Finados (2 de novembro); por outro lado, são dias em que todo o católico até sente a necessidade de participar das celebrações litúrgicas e de outros atos de devoção: isso é muito louvável e até recomendável. - (Continua na próxima postagem).


NB - Este texto foi aqui reproduzido com a devida autorização de seu Autor:
         Dom Hilário Moser, SDB
         Bispo Emérito de Tubarão, SC